Nuno André Ferreira premiado no World Press Photo crê que o fotojornalismo está numa “fase um pouco negra”

Nuno André Ferreira é fotojornalista de Leiria. Nascido em 1979 conta agora com mais uma distinção no seu curriculum – o 3º lugar no prémio World Press Photo numa das diversas categorias deste concurso internacional (a Spot News). Um momento único durante os incêndios em Oliveira de Frades, ao serviço da Agência Lusa, valeu ao profissional este prémio.

A exposição da World Press Photo (WPP) 2021 encontra-se patente no Fórum da Maia e foi neste âmbito que Nuno André Ferreira veio à cidade da Maia para um encontro designado À Conversa Com.

Entrevistado pelo Notícias Primeira Mão, o Nuno referiu que este tipo de prémios acalenta um profissional, mas não significa que se abram portas em termos profissionais.

Acima de tudo, a perspetiva, disse-nos, no mesmo tom brincalhão em que decorreu toda a conversa, é que “daqui a uns anos quando for mais velho, numa conversa de café, com os amigos, tenho esta história do prémio para contar”…

NPM – A foto premiada surge num momento único e também emotivo?

NAF: Nenhum momento se repete, naturalmente, mas a parte emotiva até surgiu mais tarde, pois normalmente quando fazemos a fotografia estamos muito focados no que estamos a fazer, a verificar o enquadramento e se se enquadra no trabalho que estamos a fazer.

Ali, estava a tirar fotos para a agência Lusa, com as caraterísticas de agência, num sítio recôndito. Pensava no que poderia fazer e aquele momento surge e a foto depois sai…

NPM – A imagem conta uma história forte…

NAF: A imagem conta um momento de uma criança que se encontra ali, dentro do carro, num espaço em que está protegida e não corre perigo. A foto é tirada numa estrada nacional de uma aldeia. Inicialmente, até fotografo os pais encostados ao carro e verifico que posso capturar aquele enquadramento – o contraste da criança e da sua inocência (alheia a todo o perigo) e ingenuidade em relação do perigo em volta dela.

NPM – Já tinha esta expectativa de um prémio no WPP?

NAF: Muito sinceramente não tinha. Não concorro todos os anos. Desta vez, concorri porque a Lusa está inserida numa organização que partilha fotos por todo o mundo. E esta imagem correu mundo e isso ajudou a perceber o impacto da foto nas outras pessoas. Foi o 3º prémio, mas se fosse o 10º era igual, pois só a nomeação já me chegava.

NPM – O prémio é uma honra para o fotógrafo, mas existe alguma nova perspetiva para o futuro em termos profissionais?

NAF: Não sei se abre muitas portas, nos dias de hoje. Não é nada que estivesse à espera. Até lhe chamo mais distinção do que prémio. É aquela recompensa pelo trabalho que vamos fazendo. Os prémios são daquelas coisas para, daqui a uns anos quando for mais velho, numa conversa de café, com os amigos, ter uma história para contar…

Agora, neste momento, não terá muito mais significado do que esse reconhecimento do trabalho. Em Portugal, não se valoriza muito o trabalho do fotojornalismo, se calhar também um pouco por causa dos leitores. Estes têm alguma culpa por serem pouco exigentes.

NPM – Considera que não existe muita educação para a imagem?

NAF: Sim, existe, mas as pessoas são tão bombardeadas com tanta imagem tirada ao acaso por todas as pessoas, já que hoje todos têm telemóvel e todos são repórteres. A imagem acaba por se banalizar e aparecer em todo o lado.

No entanto, as imagens tiradas por profissionais cumprem a ética e os critérios deontológicos, enquanto que há imagens banais que mostram tudo e sem respeito pelos outros, que chama mais a atenção de quem vê.

Porém, considero que, com o tempo, essas fotos vão banalizar-se de tal forma, que as pessoas vão cansar-se e valorizar mais o fotojornalismo e a qualidade.

NPM – A ligação entre a imagem e a mensagem continua a ser um veículo forte no jornalismo para transmitir a informação?

NAF: Sempre defendi e defendo isso: o fotojornalismo é uma maneira de fazer jornalismo. Assim como na rádio e na televisão há diferentes formas de comunicar, a nossa forma de contar a história é através da imagem. O fotojornalismo agora está a passar uma fase um pouco negra com estas novas tecnologias, mas penso que, mais tarde ou mais cedo, as coisas vão voltar a entrar nos eixos.

NPM – O risco profissional no jornalismo tem vindo a aumentar?

NAF: O risco continua a ser o mesmo. O que é ingrato é que continuamos a tentar ser o mais profissionais possível, continuamos a querer cumprir o nosso dever e a nossa função da melhor maneira possível e, às vezes, isso é desvalorizado, porque chegou uma imagem mais cedo e até se calhar de uma altura até mais próxima do acontecimento…pois demoramos por vezes uma hora a chegar ao local, mas há sempre lá alguém com um telemóvel que capta uma foto e ela é logo divulgada…

NPM – Quais as áreas de que mais gosta?

NAF: Não diria que goste mais de uma área ou outra, diria mais o que custa mais ou menos fazer. Mas encaro o trabalho da mesma forma, quer seja um casamento, funeral ou jogo de futebol.

Há o fotojornalismo de adrenalina que se passa em situações inesperadas, em que nunca sabemos o que vai acontecer a seguir e temos que estar sempre atentos, o que é um trabalho diferente…

NPM – Mas cada acontecimento é desafiante à sua maneira?

NAF: Cada trabalho, seja uma conferência ou um jogo de futebol apresenta os seus desafios, desde que estejamos focados em fazer um bom trabalho e tentemos captar alguma coisa de diferente também do habitual. Acaba por haver sempre um desafio.

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